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Cartéis Hub-And-Spoke: hein?

Cartéis hub-and-spoke, também chamados de "coordenação de A, B e C", dizem respeito à situação em que informações sobre preços são passadas entre duas ou mais empresas que operam no mesmo nível da cadeia de produção/distribuição (entre B e C) por meio de um parceiro contratual comum operando a um nível diferente da produção/distribuição (A). Nesta configuração, passam a existir acordos horizontais entre os que operam no mesmo nível, facilitado pela empresa atuante no outro nível da cadeia. Em arranjos anticompetitivos como este, o foco central do problema é a troca de informações comercialmente sensíveis, que, mesmo quando realizada por meio de um terceiro intermediário, pode ser comparada à troca direta de informações. 

Tratei desse tema em meu primeiro livro "Antitruste, Varejo e Infrações à Ordem Econômica", cujo trecho consta a seguir:

Essa configuração de “hub and spoke” foi verificada pela OFT, no Reino Unido, no caso Tobacco, de 2010. A autoridade concluiu que cada fornecedor de cigarro possuía uma rede de acordos com cada varejista que permitia que os fornecedores se coordenassem para a definição dos seus respectivos preços no varejo. O arranjo entre os fornecedores e os varejistas era sobretudo contratual, com cláusulas que podiam definir a paridade de preços (ex.: o preço do cigarro da marca A deveria ser o mesmo preço do cigarro da marca B) ou parâmetros de diferenciação (ex.: o preço da marca A deveria ser x% menor do que o preço da marca C, ou o preço da marca A deveria ser no máximo z% mais caro do que o preço da marca D). Assim, por meio de contratos – que foram avaliados como paralelos e simétricos –, os fornecedores A, B, C e D conseguiam trocar informações comercialmente sensíveis, sendo o varejista responsável pelo monitoramento e consequente alinhamento dos preços. Nesse sentido, na hipótese de um fornecedor, por exemplo, aumentar seu preço, já era possível antecipadamente prever o comportamento dos concorrentes no mercado, dadas as cláusulas de paridade ou com parâmetros de diferenciação dos preços. O resultado desse arranjo, segundo o OFT, teria sido similar àquele obtido por uma coordenação horizontal entre concorrentes. Nesse caso, portanto, o hub foi o varejista e os spokes foram os fornecedores.


No Uruguai, a Comisión de Promoción y Defensa de la Competencia condenou, em 2014, quatro fornecedores de comidas congeladas pela adoção coordenada de preços mínimos de revenda que eram monitorados com o auxílio do varejista Supermercados Disco del Uruguay S.A. O varejista, nesse caso, atuava como o coordenador (“hub”) do acordo entre os fornecedores (“spokes”). Em maio de 2016, a corte federal na Austrália também condenou um cartel do tipo “hub-and-spoke” entre fornecedores e varejista. Naquele caso, os fornecedores de detergentes Colgate-Palmolive, Unilever e Cussons acordaram em trocar informações confidenciais e sensíveis relacionadas ao preço dos seus respectivos produtos e também a conjuntamente alterar a oferta dos seus produtos (de detergentes “standard-concentrate” para aqueles “ultra-concentrate”). A troca de informações que afetou o mercado foi facilitada pela atuação dos Supermercados Woolworths and Coles.


Há também a hipótese de a colusão entre fornecedores incluir a marca própria do supermercado. STEINER alerta que a colusão entre marcas independentes e marcas próprias pode vir a ser um tema de preocupação no futuro. Estudos recentes realizados com modelos econômicos têm questionado em que medida a diferenciação em termos de qualidade do produto de marca própria afeta a estabilidade de uma colusão total (ou seja, envolvendo marcas independentes e marcas próprias) e de uma colusão parcial (ou seja, envolvendo apenas marcas independentes). Investigação nesse contexto foi realizada pelo Bundeskartellamt na Alemanha, no mercado de salsichas, tendo resultado na condenação dos fornecedores. Na análise realizada, constatou-se que o varejista detentor da marca própria participou do cartel que coordenava aumentos de preços juntamente com as demais marcas independentes.


No Brasil, a SG/CADE já considerou ilícitos arranjos do tipo “hub and spoke” explicitamente em pelo menos duas ocasiões: nas investigações no mercado de lousas interativas digitais em 2014 e de materiais de informática em 2015. Essa teoria, porém, ainda não chegou a ser discutida em nenhum caso julgado pelo Tribunal do CADE. Nas duas investigações realizadas pela Superintendência-Geral, notou-se que, uma vez caracterizado o caráter anticompetitivo do cartel, a eventual comprovação do uso ou não da informação pelos revendedores que recebam a informação para a formação de seu preço é dispensável para a comprovação do ilícito, tornando-se, pois, um elemento adicional, de agravação da conduta.


Para outra referência acadêmica, recentemente Joseph E. Harrington Jr, da Universidade da Pensilvânia, publicou artigo em que analisa nove casos e explica como eles atuaram como cartéis hub-and-spoke. Veja: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3238244.

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